Bruno Luiz/UOL – O TCE-PE (Tribunal de Contas de Pernambuco) apontou superfaturamento de R$ 646,6 mil na compra de livros para professores de Recife, cidade comandada pelo prefeito João Campos (PSB).
O que aconteceu
Valor pago por material para professor é mais de cinco vezes o de kit de livros para alunos. De acordo com análise do Ministério Público de Contas do TCE-PE, a prefeitura contratou os kits para professores por R$ 310,94 cada, enquanto desembolsou R$ 58 pelo material didático dos alunos.
Por outro lado, o valor unitário de R$ 310,94 contratado para o fornecimento dos kits de livros do professor corresponde a mais de cinco vezes o preço unitário do kit do aluno (R$ 58), mantendo-se o entendimento pela presença de indícios de superfaturamento na importância de R$ 194,94 por kit (R$ 310,94 – R$ 116). O valor total arbitrado a título de dano por superfaturamento soma, portanto, R$ 646.615,98, considerando-se a expectativa de recebimento por 3.317 professores da rede municipal de ensino. Trecho de relatório do Ministério Público de Contas do TCE-PE
Apesar da diferença nos valores, os kits são semelhantes. O material dos alunos é composto por dois livros para estudantes, um para a família, um kit de jogos e uma embalagem. O dos professores tem os mesmos itens, além de outros dois livros voltados para os profissionais de ensino.
Ministério Público de Contas pediu responsabilização do então secretário municipal de Educação, Fred Amâncio. Ele se demitiu na semana passada, em meio a denúncias de irregularidades na contratação de creches pela prefeitura. O órgão ainda pediu responsabilização dos secretários-executivos, dos chefes de Divisão, das equipes técnicas e da Mind Lab, empresa contratada para fornecer os kits. Também sugeriu que a companhia pague R$ 1,6 milhão aos cofres públicos por “auferimento de lucro indevido em detrimento do erário municipal”.
Órgão sugeriu que caso seja investigado na “esfera criminal”. O Ministério Público de Contas recomendou aos conselheiros do tribunal que encaminhem os resultados da auditoria para apuração, diante da “presença de indícios de improbidade administrativa e/ou de crimes contra a administração pública”.
Técnicos do TCE apontaram inicialmente superfaturamento de R$ 3,3 milhões na contratação. O relatório feito por auditores do órgão apontou que cada kit para professor teria custado R$ 3.438, 60 vezes o valor do material para alunos (R$ 58). Além disso, teria havido superfaturamento na compra de licenças de uso dos docentes —R$ 2.602 cada, contra R$ 189 das licenças para alunos. A informação foi publicada pelo Metrópoles e confirmada pelo UOL.
Ministério Público de Contas viu equívoco no cálculo dos auditores e revisou valores. Após alegações das defesas dos envolvidos, o órgão constatou que não houve superfaturamento na compra das licenças e entendeu que o valor unitário pago pelos kits para professores era menor do que o apontado inicialmente. O caso agora precisa ser julgado pelos conselheiros do TCE, que analisarão as conclusões dos auditores e do órgão de contas.
Kits fazem parte de programa educacional que teve “expressiva subutilização”, segundo o Ministério Público de Contas. O material integra o “Mente Inovadora”, iniciativa da Secretaria de Educação que começou em 2014 e busca desenvolver habilidades cognitivas e socioemocionais nos estudantes. Os técnicos do TCE-PE identificaram, no entanto, que mais de 50% dos alunos e de 40% dos professores não acessaram a plataforma nenhuma vez em 2022.
A plataforma é fornecida pela Mind Lab, contratada com dispensa de licitação. Segundo o Ministério Público de Contas, o contrato previu que a prefeitura pagasse à empresa R$ 45,6 milhões entre 2023 e 2024.
O que dizem os envolvidos
Secretário de Educação nega responsabilidade em superfaturamento. Em defesa apresentada no processo, Fred Amâncio afirmou que não cabe a ele, como titular da pasta, atuar na fase de cotação de preços de licitações e contratações diretas. O UOL também contatou a assessoria de imprensa da secretaria. Se houver resposta, o texto será atualizado.
A Mind Lab afirma que não houve sobrepreço na sua contratação. Também em defesa apresentada no processo, a empresa argumentou que a análise da economicidade do contrato deve ser global, “considerando o valor total e não apenas itens isolados”. Afirmou ainda que, mesmo se houvesse variação em algum dos itens, o valor global do contrato era “compatível com o mercado, conforme pretensamente referendado pela jurisprudência do Tribunal de Contas da União”. Disse também que deu um “desconto adicional” de 3% à prefeitura na contratação, o que “reforçaria a economicidade da proposta”.